Enquanto o sucesso não está garantido, estudantes investem também em carreiras mais seguras

RIO - Motorista prevenido sempre mantém um estepe bem conservado dentro do carro, certo? Pois gente que quer seguir a carreira artística, mas ainda não alcançou o sucesso esperado, anda fazendo algo parecido. Só que o estepe, nesse caso, é uma segunda profissão. Baterista da banda Scracho, Débora Teicher, de 20 anos, por exemplo, está prestes a se formar em Engenharia de Produção na PUC-Rio.

 

- Escolhi Engenharia para ter uma alternativa profissional de que eu goste, se a música, que é o meu grande sonho, não der certo. Tenho que me desdobrar por causa de faltas, de provas, e ainda convencer meus professores de que a banda não é só uma diversão - conta ela, que chegou a estagiar por seis meses para garantir um bom currículo de engenheira e não sair da faculdade sem experiência.

Débora comemora a boa fase do grupo, do qual faz parte há dois anos e meio - convidada pelo amigo Gabriel Leal, que se formou no mesmo curso. Ano passado, a banda (cujo vocalista, Diego Miranda, entrou agora em Comunicação Social na PUC-Rio) foi indicada como revelação no Prêmio Multishow e teve a música "Divina comédia" na trilha de "Malhação":

 

- As coisas estão começando a fluir para nós. Este ano, vamos lançar o segundo disco da banda com o apoio de uma gravadora, e teremos mais de infraestrutura de divulgação. Estamos longe de conseguirmos pagar as contas, mas animados com as perspectivas - diz Débora.

Unir a formação acadêmica com a música foi mais fácil para Bruno Muniz, de 24 anos. Formado em Economia na Uerj e mestrando em Antropologia na UFRJ, ele vai fazer sua dissertação sobre dub - gênero musical da sua banda, Laranja Dub, que lança seu primeiro disco este ano.

 

- Enquanto a banda não deslancha, vivo do dinheiro da minha bolsa de estudos e do aluguel de equipamento de som para eventos que a banda conseguiu montar - diz ele. - Pretendo continuar meus estudos no doutorado. Vou conciliar as duas coisas até uma demandar mais de mim.

Seus companheiros de banda seguem a mesma cartilha. Tiago está terminando licenciatura em Biologia na UFF e dá aulas, assim como o guitarrista Diego Furnieri. Já o vocalista Cláudio Serrano cursa licenciatura em Música na Unirio.

 

- Vamos tocar a banda enquanto ela for viável, e ela tem sido cada vez mais. Mas, se chegar um momento em que não der mais para continuar, cada um pode seguir com a sua profissão - diz Tiago.

" Vamos tocar a banda enquanto ela for viável, e ela tem sido cada vez mais (Tiago/Laranja dub) "

 

Estudante no segundo período de Cinema na PUC-Rio, Júlia Stockler, de 20 anos pensa em fazer Artes Cênicas, mas conta que optou pelo seu curso atual por achar melhores as perspectivas profissionais. Atriz do Tablado desde os 10, ela terminou recentemente de filmar "Amazônia Caruana", com Tizuka Yamasaki, e está com um projeto de encenar "Os miseráveis", de Victor Hugo.

 

- Não conseguiria escolher um curso que não tivesse nada a ver com o que eu faço agora, mas pensei em algo que pudesse ser mais rentável.

 

Para Sandra Korman, coordenadora do departamento de Comunicação da PUC-Rio e especialista em planejamento profissional, o "plano B" tem que ser igualmente prazeroso:

 

- Quem faz Administração e tem uma banda, por exemplo, pode usar o que sabe no seu projeto, pois a música não deixa de ser um empreendimento. Na hora de escolher uma carreira alternativa, é preciso que seja uma escolha que faça sentido para a pessoa, mesmo que não tenha nada a ver, e não uma obrigação.